sexta-feira, 25 de abril de 2008

Ataíde

Ataíde apareceu à hora combinada. Calças de bombazine, t-shirt preta, sapatos de ténis e meias brancas. – Com ténis, sempre meias brancas - dizia. - É a idiota obsessão pelas meias brancas que faz de nós uns provincianos. Não os que as usam mas os que se preocupam com o que os outros vestem, ou calçam.
- Estás vermelhinho - disse-lhe, sabendo o quase ódio que tinha a benfiquistas e comunistas.
- Praia, amigo. Primeiro dia, hoje, na Caparica. A sight for sore eyes - Ataíde utilizava frases idiomáticas inglesas com frequência.
- Sério? Estão melhores as portuguesas?

Sorriu.
- Brincos nos umbigos e tatuagens com fartura. Minhas queridas inglesas que, ridiculamente, apanhavam banhos de sol em Hyde Park. Na Caparica, só as velhas, que poderíamos pensar serem as mais estúpidas, não são. Se algo há que vale a pena observar são os cães. São eles a atracção viva da praia.
Sorri eu. Este Ataíde...

– Os cães?
- Sempre gostei de pêlo e de olhares sinceros. Trocar pêlos por borbulhas, e olhares de vaidade escusada, não ficam bem a nenhuma mulher. Se for bonita ainda escapa, mas bonitas não existem na Caparica, ou não foram hoje à praia. What do I care.

Saímos depois de bebermos o chá. Ataíde, a olhar para um Vacheron Constantin numa montra, choca contra uma mulher que vinha a passar.
- Peço desculpa.
- Caramba! - disse ela. E seguiu.
- Aposto que tem brinco no umbigo e tatuagem na perna – segredou-me ele, e sorriu.


made in eu

1 comentário:

Anónimo disse...

Já tinha saudades destas conversas! A comunicação com quem lê está exemplar; acredita, é um dom. De resto, esta conversa podia ter sido nossa, perfeitamente.