quarta-feira, 12 de abril de 2006


Nem Páscoa havia pensado por que assim se chamava, nem tão pouco a sua galinha.
Páscoa era de uma timidez absoluta e até o facto de o verem entrar na capoeira lhe causava arrepios e suores. Suores nocturnos, se quisesse ver a galinha já de noite.
Assim vivia Páscoa entre a vergonha do galinheiro e o som horrível e nada melódico dos ensaios com o clarinete, com que o vizinho o acordava, quase todos os dias, às dez e vinte da madrugada. Às vezes às dez e vinte cinco.
Foi numa manhã, pouco antes das doze e quarenta e cinco, - a referência à precisão das horas é notável, porquanto sabemos, Páscoa não usava relógio -, que o ovo foi visto. Nem casca, nem gema, nem mais claro nem mais escuro. Luzia como nada antes visto por Páscoa, mas usando de cautelas, pensou: Nem tudo o que luz é ouro. Bem pensou mas fora da realidade daquela vez. Ouro era, a galinha o pusera.
Entrava em casa com medo de o poder entregar aos bandidos, sob ameaça de arma branca, quando o clarinetista, ou pseudo, se assomou à janela e gritou: Bem o vi eu também, bem o vi. Páscoa, meteu a cabeça de fora e disse: Quão bem o viste? Quere-lo? Tomas destes. E atirou um ovo verdadeiro, daqueles que compramos nos hipermercados, em caixas de papelão que sempre se abrem à procura de algum partido. Não sabemos a classificação do ovo que Páscoa, com uma pontaria que julgava não ter, acertou em cheio na cara do vizinho. XXL? XX? Não sabemos e não o saberemos nunca.
No próximo capítulo adiantaremos algo mais sobre este atrito entre vizinho, mas já podemos adiantar que, a partir deste episódio, o clarinete começou a soar às dez e quinze e saberemos o quanto alterou a vida de Páscoa, estes cinco, ou dez, minutos adiantados de horríveis sopros supostamente melódicos.

Boa Páscoa à São do meu CoraSão.

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